Por mais um dia o esposo não encontrara emprego, tampouco o procurara, somente tomou alguns goles de canha barata nos botequins da Francisco Reverbel como se o álcool fosse solucionar os seus problemas cotidianos. Ao anoitecer o ébrio senhor entra na sua casa um pouco perdido e um pouco sujo e atira-se nos pelegos da sala de estar. Aos berros sua senhora o levanta em meio a bordoadas pela cabeça e pontapés nas nádegas.
__ Sem vergonha! Chegastes mais um dia bêbado e cagado em casa! Quem vai lavar estes teus cagados? Quem vai alimentar teus filhos que gemem de fome? __ Exclama a mulher com seu porrete em riste.
O bêbado sem resposta ou qualquer reação é colocado para fora da casa, rolando pela calçada e, ao parar junto ao poste, fica escorado semelhante a um saco de batatas.
Algumas horas depois, quando os primeiros raios de sol iluminaram o antigo bairro do frigorifico, o rapaz que outrora estava bêbado agora sente uma labareda que arde sem cessar nos miolos combinada com os galos das porretadas que sua senhora o havia desferido. Ele se escora no poste e esfrega a cara reclamando do odor a podre que saia da sua face, em meio aos olhos. O cheiro assemelhava-se a leite coalhado de no mínimo 5 dias.
Diante dessa situação de total humilhação, o rapaz senta no meio-fio e brada ao léu:
__ O que faço? Cagado dessa maneira, fedendo a leite azedo e com bafo de cachaça, de que forma alimentarei meus filhos e minha mulher? Nada me resta se não morrer. __ E pôs-se a chorar de maneira copiosa, como criança pequena, de maneira que nada o fazia esquecer daquele desejo de morte.
Pois então ocorre o curioso fato: O homem enquanto chorou se deu conta que das suas vistas vertia leite de textura única, como de um seio mamífero que alimenta a descendência. Diante desse fato o homem ficou estarrecido, estava a chorar leite de sabor diverso, superior aos melhores leites frescos que existiam na localidade.
O homem levanta-se e bate na janela da casa, onde um dos seus filhos desperta e abre a porta.
Entrando de maneira afobada agarra seu filho e chama os outros 3 para mostrar-lhes o fato ocorrido. Sentou-os numa banqueta rota de madeira e pegou um copo. Os filhos olhavam com certa desconfiança de ser mais um devaneio de bêbado que costumeiramente viam em seu lar. Então o pai diante das crianças olha para o copo, encarando-o com zelo e fechando os olhos. Fez-se silêncio durante alguns segundos, os filhos cada vez mais preocupados com a saúde fisica e mental do pai, então, entre alguns soluçares, um jato de leite fresco e cremoso verte das vistas do homem, de forma milagrosa, enchendo o copo até transbordar, para assombro dos pequenos famintos e beberam tudo e lamberam o chão molhado pelo branco e saboroso leite.
Ao ouvir todo o burburinho a mãe surge na sala se perguntando de onde saiu aquele leite, pois seu marido não trazia para casa nenhuma bebida sem álcool há anos. Ela segura seu esposo pelo pescoço e pergunta de onde saiu aquele alimento. Ele responde que dos seus olhos verte leite.
Sem nenhum tipo de resposta à tal afirmação, ela olha atenta aos olhos do marido e pergunta:
__ De que maneira pode sair leite dos teus olhos? Logo tu um bêbado vadio!
Ele responde:
__ Traga aquele copo! __ O filho o entrega o vasilhame e ele concentra-se fixamente. Menos de 1 minuto foi o suficiente para lavar o colo da mulher e encher o copo de leite fresco, espumoso.
Era realmente fascinante! A família que carecia de alimento encheu a barriga com o leite que vertia dos olhos do patriarca, e assim foi durante alguns dias.
Determinada manhã o vizinho da família entra na casa para pedir um pouco de açúcar, a mãe o recebeu e lhe serviu um pouco do leite que o marido chorara antes de ir para o boteco.
O vizinho chamado Paulo bebe o leite e espanta-se com o sabor daquela bebida e pergunta:
__ Venha cá, vizinha. De onde veio esse leite tão gostoso?
Ela olha para os lados e sem resposta confessa:
__ Meu marido há alguns dias descobriu que dos seus olhos vertia leite, desde então o ordenhamos diariamente de forma que nunca mais passamos fome.
Paulo ficara perplexo com tal afirmação, saindo da casa ao encontro da vizinhança para falar sobre o curioso caso.
Não demorou 1 dia para que uma fila se criasse na porta da casa do homem que chorava leite, todos queriam provar o tal leite celestial que saía dos olhos daquele ébrio rapaz.
Caridoso com a comunidade, ele se colocou à serviço chorando em vários copos, vasilhames e pratos que eram postos no mesa da cozinha.
Só que, com o passar do tempo, ele começou a se debilitar ao ponto de acabar o todo leite. Naquele momento encontravam-se não menos que 6 pessoas empunhando recipientes e clamando pelo tal leite. Não havendo maneira de satisfazer os vizinhos, ele explica que não conseguia mais, parecia que não tinha mais leite.
Uma revolta tomou o lugar, o descontentamento junto com a raiva dos azarados vizinhos causaram um tumulto, onde várias pessoas tentaram agredir o rapaz, que sai correndo pela rua.
Vários que estavam na casa e outros que estavam chegando para buscar o leite se puseram a correr atrás do rapaz, que na primeira curva atirou-se numa boca-de-lobo, ficando ali oculto por dois dias e duas noites.
Em meio a tanta solidão, o rapaz considerou o misterioso leite como algo ruim e resolveu dar um fim naquela situação de perseguição e raiva, saiu correndo pela rua em direção à planta frigorífica gritando que naquele momento acabavam-se seus problemas. Alguns metros foram percorridos enquanto ele com as próprias unhas arrancava seus globos oculares, deixando um rastro de leite e sangue pela rua, terminando sua corrida final na rua dos plátanos, onde cai desfalecido com a cara tomada em sangue.
Vendo aquele moribundo cair no seu quintal, a velha senhora moradora dessa casa o coloca para dentro da garagem e o esconde.
Perguntado sobre o que aconteceu e por que estava sem os olhos ele somente disse que terminou com seus problemas, seus olhos nunca mais iriam dar leite para ninguém.
Ouvindo tal absurdo, a senhora cuida das feridas e hospeda o rapaz por alguns dias.
Barbudo e sedento pela cachaça, ele sai sem rumo pelas ruas em direção ao cerro do armour, de onde nunca mais souberam-se notícias dele. Alguns moradores afirmam que ele ainda é visto pela noite vagando no mato, sem visão, sem cobiça e sem leite.
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